quarta-feira, setembro 07, 2005

Murray, McCarthy e os primários

Acabado de colher da Natureza do Mal, aproveitem enquanto está fresquinho:

O meu tio A. era uma pessoa calma, que nunca levantava a voz. Quando uma vez falava comigo da URSS, a voz ficou-lhe ainda mais rouca e disse que eu era um anticomunista primário, o que me não magoou, porque sabia que a palavra primário se seguia automaticamente à palavra anticomunista, mesmo nas pessoas boas e generosas como foi sempre o meu tio A. Eu não era um anticomunista primário. Os primários diziam que os comunistas matavam os velhos com uma injecção atrás da orelha quando o método mais utilizado era o tiro na nuca.Há agora um género de pessoas que, quando alguém fala do presidente Bush e dos neo cons com o desprezo que eles merecem, ou simplesmente fala dos Estados Unidos com alguma crítica, saltam logo com o antiamericanismo (uma doença da esquerda europeia, dizem) e pegado ao antiamericanismo, vem o primário. Devo declarar que gosto muito de New Orleans. Fiquei contente quando encontraram Fats Domino. Como os pobres e velhos, ele não teve tempo, meios ou vontade de fugir. Gosto de New Orleans por causa do jazz, do Mississipi, da proximidade de Louisiana onde foi rodado Shy People (1987) do grande Andreï Kontchalovski, do gang do Tom Sawyer, do Huckleberry Finn e da viúva Douglas. Não têm fim o nome dos americanos que admiro. ( Tive, um ano inteiro, uma americana nas paredes de um quarto que habitei.) Numa entrevista recente o actor e realizador George Clooney , contava que o pai, um jornalista do Kentucky perseguido durante o McCarthysmo, manteve sempre opiniões de grande coragem, tendo como modelo Edward Murray, um símbolo da independência jornalística nos USA. “Com a minha irmã aprendemos a comer depressa quando éramos convidados por outra família, porque o meu pai quase sempre discutia com os anfitriões e tínhamos que nos ir embora antes da sobremesa.” E Clooney, que dirigiu Boa Noite e Boa Sorte, para recordar Murray e Mc Carthy, continua: “E sabe que mais? Sinto orgulho de todas as discussões, de todas as refeições sem fim e de todas os despedimentos de que ele foi alvo.”Desta América sou eu. Podem ficar com as sobremesas.

E acrescento: É fácil dizer que os outros são anti-americanos por fazerem críticas à actual Administração Americana! Basta não ser negro, pobre, descendente de escravos, semi-analfabeto e não viver de pensão de sobrevivência!

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